Nas festinhas estão lá, nos parques estão lá, têm de ser escorraçados das escolas. Os angustiados pais helicóptero são incontornáveis.
Eles chateiam-me imenso a existência. De várias formas.
Para já, eles poluem o ambiente dos miúdos. Minam o parquinho com a sua hipervigilância, com a sua inquietude, com o seu controlfreakness. Sempre a amparar, a podar o andamento do seu e dos outros. "Cuidado, cuidado" Não desças!" "Desce!" Estás bem, amorzinho?" "Queres águinha?!" "Não faz isso". Enfim. Estragam as brincadeiras dos miúdos, interrompem-nas, impedem a sua livre passagem, estragam as aprendizagens dos miúdos, sobretudo aquelas que são mais físicas, mesmo brutas, mas que são fundamentais para o seu desenvolvimento físico e social, no que de mais primário têm.
Isso chateia-me indirectamente. Mas directamente também me chateiam, quando começam a ficar nervosos, quando começam a lançar olhares reprovadores a torto e a direito, quando começam a perguntar-se como é que é possível que apenas eles estejam a tomar conta das crianças? "Onde andam os pais destes meninos, que aqui andam como meninos selvagens?" "Onde está a tua mamã, que não está a tomar conta de ti, hein?" Cá estou eu, depois de me levantar a bufar por dentro, apenas para picar o ponto, apenas para marcar presença e mostrar que aquele menino tem mãe e que ela até está atenta. Como poderia eu não estar, pois se tenho uma barata tonta a helicopterar à minha frente?
Mas mesmo quando eles não estão a chatear-me a cabeça, directa ou indirectamente, ainda assim chateia-me apenas a sua presença. Tomei-os de ponta. Por exemplo, nestas festas de anos modernas, em que há toda uma esoécie de recintos organizados para entreter os miúdos em segurança, por duas a três horas, dando-lhes brinquedos, actividades, comida e bebida, dando a oportunidade aos pais de ir à vida deles enquanto os putos se divertem. É um oásis no fim-de-semana de qualquer pai que se preze. Não só se livram da prole para ir desopliar um par de horas, como evitam as conversinhas de circunstância com os outros pais que mal conhecem. Os pais não se fazem rogados, depositam os putos e ala que o tempo está contado. Menos os pais helecóptero. Eles ficam de estaca na festa, a supervisionar os miúdos do princípio ao fim. São uma sombra dos seus filhos, só não entram no recinto de actividades quando lhes é expressamente vedada a entrada, ou porque não têm meias anti-derrapantes. O ridículo. Mas não perdem um movimento do seu querubim, a cabeça sempre em movimento, a detectar a cria, o modo helicóptero em high speed. Umas autênticas suricatas.
E quando os miúdos estão ao seu alcance, por exemplo, sentadinhos à mesa, a lanchar, os pais helicópteros são a entourage do seu filhinho, dois passos atrás do petiz, a ver cada movimento, a ver se nada se descontrola.
Mas descontrola como? Para que situação? Qual é o problema? Mesmo que haja um problema, não se resolve? Não estão lá adultos reponsáveis, pagos e dedicados à situação? Mas eles não descansam.
Quando eles não me estão a chatear a cabeça, e eu os vejo apenas em abstracto, apenas em lembrança, eu tenho pena deles. Tenho mesmo pena.
Porque eles devem viver numa angústia enorme, o tempo todo. Que terror vive na cabeça de pais que são incapazes de deixar os seus filhos sozinhos, ou apenas vê-los de longe, de deixá-los desenvencilharem-se e aprender por si a conviver com os outros, a fazer as suas próprias conquistas? Que terror passa pela cabeça de pais que são incapazes de confiar nos outros, de confiar no filho que estão a criar, de confiar na sua parentalidade? Não consigo responder, nem quero, felizmente não é um problema meu (nem sempre...).
Mas sobretudo sinto pena porque estes pais estão a fazer uma cama complicada de deitar. Eles estão a entalar tanto os lençois, a puxar tanto a manta, a fazer e refazer e vincar tanto a dobra, que das duas uma: ou às tantas ninguém mais se quer deitar naquela cama, mandando os pais à fava, vendo-se e desejando-se por vê-los pelas costas, ou vão lá deitar o miúdo e ele não vai conseguir sair, não vai ter força e independência para nada, vai depender dos pais para se virar na cama, para pedir aprovação para se levantar, para sonhar, para viver.
Pais hipervigilantes dão filhos fartinhos de todo ou filhos dependentes para tudo. E nenhuma das duas opções me parece boa. E pelo meio, perdem-se duas pessoas que até poderiam ter outros interesses, outra forma de ser, mas que deixaram de ver o resto das suas vidas, só vêem os filhos, mais nada. Mas sobretudo, perdem-se uns pais, com palas nos olhos, que deixam de ver a sua própria parentalidade com olhos de ver, e deixam de ver o seu filho crescer enquanto ser humano, de tanto lhe fazerem a cama.
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5 comentário(s)
Compreendo o que diz, mas acho que cada pai faz o que acredita que é o melhor para o seu filho, e os perigos muitas vezes vem de onde menos se espera.
Os perigos existem sempre, por muito que se proteja os filhos. Pior, se não se ensianr os filhos a lidar com os perigos, quando eles chegarem, os filhos não vão saber lidar com eles. Sabermos ultrapassar as nossas ansiedades de paispara o bem maior dos nossos filhos, não o bem imediato, é o melhor que podemos fazer por eles, por muito que nos custe no imediato.
eu tenho para mim que a culpa é do governo grin emoticon são eles que não dão verbas, não abrem concurso e não estimulam que as câmaras e juntas de freguesias metam uns bancos para os pais se sentarem nos parquinhos!!! é só por isso que eles ficam em cima dos brinquedos e da miudagem.
Hahahaha, é só por isso! Depois em todas as outras situaçãoes é o hábito!!
Aos pais helicoptero apenas lhes pergunto isto: - Que tipo de adultos vão ser os filhos se toda a vida deles tiverem sempre lá alguem para os ajudar e amparar? Não me parece que vão ser adultos decididos e desenvencilhados, mas sim, pessoas indecisas que não saberão resolver os problemas que lhes vão surgir ao longo da vida.
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