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O Pai Anónimo | O Queixume: A Fadiga do Material

Por O Pai Anónimo

Estamos de regresso a este espaço de reflexão. Para todos os que protestaram pelo tempo de ausência, o meu pesado lamento. Não obstante, não é caso para tanta crítica, afinal, o Pai Anónimo faz o mesmo que outros pais e mães a braços com a prole: perante a necessidade de avançar com um prazo ou uma hora, responde o clássico “não sei bem, vamos ver, sabes que agora com os miúdos…”.

Sendo este um espaço de protesto, mas também para dar voz aos que não têm voz, vamos corresponder a vários pedidos que, de uma forma ou de outra, falam de uma mesma necessidade. Parafraseando um leitor (devidamente identificado), refiro-me a uma “caixa de queixumes”, onde seja possível partilhar as dificuldades, frustrações e perplexidades do homem moderno, apanhado nas curvas da paternidade. Ou, se quiserem, ao gajo a quem ninguém realmente liga, porque as mães. Sempre as mães.

Um desses lamentos tem a ver com a recordação do tempo em que “um gajo para sair de casa não tinha que levar a casa às costas…”. E isso, ainda que não inteiramente rigoroso – basta lembrar de como era ter de carregar o carro com toda a bagagem da mulher, antes dela ser mãe, ou projecto disso – remete para outra realidade. A de todos os objectos e parafernália que, de repente, passaram a fazer parte da vida de todos os dias, e de como têm duas dimensões, uma espécie de yin e yang trágico. A natureza contraditória do boneco fofinho e sorridente e da dor que ele inflige quando o pisamos inadvertidamente no chão da casa-de-banho. Ou, igualmente impressionante, vermos o corpo mutilado de um peluche ou de um outro brinquedo, que até julgávamos robusto, e pensarmos que o carrasco foi o nosso petiz.

Os exemplos, na verdade, são inúmeros. A cadeirinha do carro, outrora de corres claras, e agora de cores escuras. Ou então de cores escuras, agora desgraçadas. O diminutivo de uma cena que é pesada, chata de montar e que ocupa espaço. A sacana da cadeirinha, que quando se tira é um festival de migalhas, areia, pó, mesmo se limpo na semana passada. O Mickey do assento, que continua a olhar para nós, sorrindo, mas com um olho desfiado e nariz desbotado. Pedindo clemência, ou pelo menos mais um copo, para aguentar. O ecrã da televisão, um campo de batalha coberto pela babusca da derrota ao chamar o puto mais pequeno à razão. Baza já daí. O sofá, manchado com aquele erro crasso de deixar o chocolate ao alcance de uma mão.

A sacana da chupeta, sempre a evadir-se. Onde é que está a chupeta. A obrigar-nos a dizer uma palavra feia. Essa mesmo, mas seguida de outra, e antecedida de outra ainda, numa febre crescente. A rosnar o carago da chupeta. E ela a gozar, atrás da tralha, a obrigar-nos a acender a luz, travestida com uma fita de prender a roupa, sempre fofinha, mas também cansada, e gasta, e a pedir banho.

É como se os brinquedos e toda a tralha necessária para fazer a vida com os filhos fossem uma espécie de Toy Story cruzada com o Crusty the Clown. Falam, à noite, jogando cartas e dispondo-se estrategicamente, minando o corredor, para abrirem uma sirene de músicas mecânicas sem botão que as desligue quando tropeçamos neles. A mobília, essa, sofre em silêncio e nós continuamos sem saber onde é o puto meteu o raio do comando da televisão.

Para todos os solitários out there, estamos a receber os vossos contributos. É só escrever para global@eumae.pt. A vossa verdade merece ser contada.

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1 comentário(s)

sofia21 de Maio, 2015 às 00:21:34
Responder

e ainda há bocado andámos à procura da sacana da chucha por todo o lado e ela estava... na cama do próprio...

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