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Crónicas de uma Mãe Divorciada | O dia da não-noiva

Por Kiki

Todas nós sonhamos com o dia do nosso casamento. Desde pequenas, imaginamos o véu, as flores, as amigas, a igreja, tudo!!! É-nos vendida e enfiada a ideia de que será o dia mais feliz das nossas vidas. O que até poderia ser, se o stress não fosse tanto ou se os saltos altos não nos dessem cabo dos pés. (Lembro a lua de mel como dias muito mais felizes do que propriamente o dia do casamento em si.)
Mas o dia que não ensaiamos vezes sem conta, o dia para o qual não imaginamos o vestido nem idealizamos as flores, é o dia do divórcio. Quando efectivamente percebemos que vai acontecer, não há propriamente uma preparação especifica. Estava tão absorvida com o que ia acontecer que não pensei sequer se queria companhia, ou que roupa vestiria. As minhas amigas ofereceram-se para irem comigo. Mas lembro-me de encarar a coisa como uma missão. Ou como um ritual de exorcismo que precisava enfrentar sozinha. Faz um ano! É inevitável não recordar. E depois de ter andado a viajar por textos antigos, encontrei este. O meu dia da não-noiva.

22.Outubro.2013
Acordei com a estranha sensação que tinha um compromisso importante mas que não sabia bem como reagir ao mesmo...
Estranho ter comparado todos os momentos do dia com os momentos do dia em que me casei.
Tomei o pequeno-almoço sozinha no sofá em frente à televisão e lembrei-me que 6 anos antes estava a tomar o pequeno-almoço numa casa cheia de galinhas que estavam mais histéricas do que eu. Soube-me bem estar sozinha a beber não só a minha meia de leite, mas também o sabor da vida e principalmente, sentir o sabor do momento.
Achei que devia ir ao cabeleireiro. Não para me por bonita para a ocasião, mas para me mimar. Apeteceu-me ter pena de mim só durante aquele bocadinho. Sentei-me na cadeira do cabeleireiro para lavar a cabeça e mais uma vez me lembrei de há 6 anos atrás quando, sentada no quarto dos meus pais, tinha duas cabeleireiras em cima de mim e um bando de amigas queridas a apaparicarem-me! Apetecia-me fechar os olhos e relaxar, mas a rapariga angolana, alta e gordinha que me lavava a cabeça teimou em trazer-me ao mundo dos vivos e lavou-me a cabeça como se me estivesse a ceifar os últimos pensamentos de casada. Entre os picos de água gelada alternados com os picos de água a ferver e as unhas dela a esfregarem o meu couro cabeludo, sobrou pouco para tristezas e auto-comiseração.
Vesti-me de forma elegante como se fosse para uma reunião ou uma entrevista. Pús uns saltos de 18cm para me dar confiança. O cabelo esticado e liso e as unhas pintadas de encarnado também me ajudaram a ter alguma auto-confiança e a enfrentar o dia de cabeça erguida.
À última da hora resolvi convidá-lo para almoçar. E ao contrário de há 6 anos, comemos antes e chegámos juntos. Foi simpático o almoço. Emborquei um (enorme) copo de vinho tinto dos bons. Estava sol em Lisboa e a esplanada era uma das minhas preferidas.
Seguimos para a "cerimónia". À porta estava uma noiva. Um suspiro gigante que levava estalos da mãe por estar a chorar desalmadamente. "Mas tu vens para um casamento ou para um funeral?" Pimbas! E acentava-lhe na cara! Ainda pensei gritar: Run Forest, run! Ainda vais a tempo pá! Mas quero acreditar que as histórias com final feliz existem e eu sei que ainda vou ter a minha.
Tal como há 6 anos atrás, sentámo-nos lado a lado. Mas em posições invertidas. Desta vez fiquei à direita. A vida a ser irónica outra vez? Fruto do acaso possivelmente...
Demos o sim. Mas desta vez não foi à união. Foi ao fim dela. Com um nó na garganta e as mãos húmidas... Não por não querer dar este passo... Mas por ver finalmente a coisa acabada. Deu o toque para a saída. Arrumámos ali 6 anos de vida em comum na pasta, metemos a mochila às costas e seguimos com a vida. Ficam as memórias. Estranhamente ficam as melhores. Bom assim. Prefiro sentir algum carinho pela pessoa que me deu dois amores incondicionais. Porque afinal foi isso mesmo que aconteceu. Ele foi-se embora deixando-me dois amores incondicionais. Talvez tenha sido esse o propósito do nosso encontro. Se calhar pari um Presidente da República e uma Prémio Nobel da medicina. Vai-se a ver e estas crianças tinham mesmo de vir ao Mundo! Ainda bem que assim foi. Mesmo que daqui a uns anos afinal ele queira ser futebolista e ela advogada ou jardineira. Que se lixe! Quero é que eles sejam felizes. Mas quero sobretudo que eles não saiam magoados disto tudo. Que tenham orgulho nos pais e que compreendam tudo o que foi feito. E que apesar do casamento que os trouxe ao Mundo ter acabado, há memórias felizes do tempo em que os pais se amavam e desejaram que eles nascessem.
Quanto a mim, estou serena. Leve. Pode parecer mal dizer feliz. Mas acho que sim... Estou feliz...
Quanto a nós, somos amigos. Acho que ficou o carinho e o respeito. Mais agora até talvez... Espero que o tempo nos faça ser bons amigos.
A vida consegue ser irónica! Muito irónica. Mas depois vais a ver e quando juntas as peças, tudo faz sentido. E é assim que as coisas têm de ser!

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8 comentário(s)

Vanda Silva21 de Outubro, 2014 às 14:23:43
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É de facto um dia com que não sonhamos, mas em tantas vezes faz sentido. Espero que hoje seja um dia bem mais feliz, bem mais resolvido, bem mais sereno, sem unhadas e água fria, apenas amor e serenidade! Beijinho e mais uma vez, adorei!

Dina21 de Outubro, 2014 às 14:32:52
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É muito bom ler estes depoimentos.... Gostei :) beijinhos

Crónicas de uma Grávida Acamada21 de Outubro, 2014 às 14:57:48
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Tão bom <3 Vais ser feliz muito feliz de certeza!

Andrea21 de Outubro, 2014 às 16:20:50
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Foi bom ler este depoimento..gostava de ter essa tua coragem e ser feliz!

Bi21 de Outubro, 2014 às 18:47:24
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Um beijinho enoooorme Kiki!! <3

DM21 de Outubro, 2014 às 23:22:32
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Revi-me completamente! Desde a dúvida de 'o que é que eu visto' à esplanada prévia em conjunto e às amigas a insistir em ir. Com mais um ponto de requinte. quando chegámos a conservadora olhou para os dois e perguntou 'já estão todos?' ao que ele respondeu com humor 'só viemos os dois, era preciso mais? De facto há uns anos éramos 200 mas hoje é 5ª feira, não podiam...' Ninguém nos prepara... preparamo-nos nós e crescemos

inês22 de Outubro, 2014 às 09:51:23
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Um dia que nós mulheres não acreditamos que nos bata à porta ....mas que é possível! Muita força Carolina. Gosto muito da sua forma de "estar" com a vida...! Que a vida lhe traga novas brisas frescas para respirar, novos caminhos a percorrer, e vai ver que com os seus meninos ao seu lado, tudo vai ser ESPECIAL. BJINHO

Luciana Barbosa18 de Novembro, 2014 às 22:42:21
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Emocionei-me!

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