No dia 10 de Março de 2004 eu estava a viver em Bruxelas.
Apanhei um TGV para ir a Paris ter com o meu pai, mesmo depois da minha mãe me pedir por tudo para não ir. Havia grandes ameaças terroristas em Paris, principalmente nas linhas férreas.
Não lhe dei ouvidos. Tinha 23 anos. Queria lá saber das ameaças. Queria era aproveitar a vida! E naquele dia, aproveitar a vida era ir ter com o meu pai a Paris. Havia mais polícia do que o habitual, mas a viagem correu bem.
Quando cheguei a Paris, devia apanhar o metro para ir ter ao hotel. Aquela estação estava fechada. Havia uma ameaça de bomba. Disseram aos passageiros que, quem quisesse, podia ficar dentro da carruagem à espera que eles analisassem o embrulho estranho, quem preferisse, podia apanhar transportes alternativos.
Aí tremi... Com os joelhos a falhar liguei ao meu pai.
- Pai, é melhor apanhar um taxi para ir ter ao hotel. Pagas-me o taxi?
Estava tão preocupada com os euros que ia gastar como com a minha própria pele. Como se ambas as coisas pudessem dividir equilibradamente a percentagem de prioridade na minha vida. Não tinha nada a perder na altura... Podia ser irresponsável e inconsequente.
Subi as escadas rolantes a correr e fui procurar um taxi.
Quando cheguei ao pé do meu pai, passou-me o medo. Os pais têm estes poderes mágicos!
Fomos passear a pé, fomos a um dos nossos restaurantes preferidos. Pusemos a conversa em dia!
No dia seguinte, 11 de Março de 2004, acordo no hotel e ligo a televisão. Só vejo pessoas em pânico. Um comboio desfeito. Sangue. Jornalistas a tentarem perceber o que era aquilo.
O coração salta-me pela boca.
Tinha sido em Madrid.
Lembro-me de passar o dia sozinha a passear porque o meu pai estava a trabalhar. Não se falava de outra coisa. Embora o facto de não haver Facebook, controlasse melhor o histerismo colectivo. As pessoas paravam à frente das televisões. Comentavam nos cafés.
No dia seguinte, tive de voltar a apanhar um TGV para regressar a Bruxelas. O meu pai deixou-me na Gare du Nord e aí já me custou mais. Deixá-lo ali e ir sozinha. Só voltei a respirar quando entrei em casa.
Hoje em dia sou Mãe! Tenho duas crianças dependentes de mim.
Morro de pensar que eu possa faltar um dia aos meus filhos.
Morro de pensar que eu possa não os ver crescer.
Morro de pensar que possa acontecer-lhes alguma coisa horrorosa por causa de pessoas que nada temem.
Este fim‑de‑semana não estava em Paris nem em Bruxelas, não precisei de andar de TGV nem de avião. Mas sofri bem mais do que há 11 anos atrás.
O pai dos meus filhos estava ontem dentro de um avião quando vejo as notícias de que França estava a bombardear a Síria... Estamos (e não é só deste fim‑de‑semana) a viver, sem nor darmos conta, a 3ª Guerra Mundial.
Não consigo explicar a sensação... Não descansei enquanto não tive a certeza que tinha aterrado e que estava tudo bem.
A ideia de que algum dos meus me possa faltar por causa de pessoas cujo objectivo na vida é matar, rouba-me a respiração.
Não consigo ouvir a Marseillaise, sem ficar com os olhos turvos e o coração sufocado. Por cada pessoa que perdeu a vida, penso nos pais deles. Nos filhos deles. Nos amores deles!
O sentimento é de uma frustração histérica, paralisante e tenebrosa. Um medo avassalador da incerteza do que está por vir. Um pânico nojento das coisas que aquelas pessoas são capazes de fazer.
Hoje saí da escola a correr. Fui a correr buscá-los e viemos a correr para casa. Não estávamos a fugir de nada, apenas a querer aproveitar melhor o tempo. Olhar para eles com mais intensidade. Dizer-lhes mais vezes que os adoro. (Já não me podem ouvir) A urgência da vida. A urgência do amor. Só porque nunca sabemos o dia de amanhã. Precisava de brincar urgentemente com eles. Ataques de cócegas urgentes.
Abraçá-los urgentemente.
Abraçar urgentemente os meus!
Dizer urgentemente o quanto gosto deles.
E eu sei que não devemos viver a pensar nisso para não deixarmos de viver, mas neste momento é o que me apetece.
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