Eu até me gabo de safar bem nas perguntas intermináveis que o Pedro tem feito. Eu agora vivo num episódio do "Livro dos Porquês" do Markl, lembram-se? O dia todo eu tenho a Manuela Azevedo no cérebro e o Pedro nos ouvidos: "Porquê? Porquê? Porquê? Porquêêêêê?"

E eu vou respondendo estoicamente, sempre com uma tirada genial na ponta da língua. Das duas uma, ou dou-lhe com a verdade técnica, ou dou-lhe com respostas curtas, e quando já não posso com tantos porquês, respondo interminavelmente, a resposta é tão longa, confusa e cara, que ele fica com um nó cego na mioleira, coitadinho. E vai brincar a outra coisa, que isto de tirar dúvidas já não está com nada.

Mas com perguntas sobre os aviões que voam e os ursos que têm pelo posso eu bem, mas confesso que há certas perguntas para as quais não estava de todo preparada, e ainda a procissão vai no adro...

"Mãe, porque é que bateram no Jesus quando ele morreu?" Olhos esbugalhados deste lado. Mas quem é que anda a dar a catequese ao puto às escondidas? Já perguntámos no colégio e disseram que é ele quem faz as perguntas, não sei quem é a catequista secreta, mas explicar ao Pedro porque é que ninguém dava guarida ao Jesus no Natal já foi complicado, explicar a crucificação tem sido um nível bem acima. Porque é que lhe bateram, porque é que ele voou para o céu, quem é o pai dele, porque é que o mataram? As perguntas são sempre super dramáticas e tudo tem a ver com morte, o Pedro anda fascinado com a morte. E com a Páscoa! "Porque é que o coelhinho vem na Páscoa? Porque é que ele põe ovos?" O pagão e o profano, já bem me bastava o Pai Natal e o Menino Jesus, coragem!

"Mãe, porque é que só os namorados dão beijinhos na boca?" Olhos a revirar deste lado. Não, eu não quero entrar no maravilhoso mundo da sexologia nesta altura do campeonato, NÃO!!! "Porque é que eu não posso dar beijinhos na boca aos meus amigos?" "Porque é que a Rita me faz caretas? Ela já me deu um beijinho na boca!" Nããão, eu não quero ouvir! Cheguei à dura conclusão de que sou uma mãe ciumenta e possessiva, afinal não quero lançar o meu filho para o mundo, sobretudo não o quero lançar para os braços de uma Rita flausina, não!

"Mãe, porque é que as pessoas morrem?" "Mãe, porque é que dói morrer?" Olhos a pensar profundamente para dentro, a tentar lembrar as aulas de filosofia, a catequese, ao mesmo tempo que respondo com biologia."Vamos para o céu como o Jesus? E depois acordamos como o Jesus?" As temáticas cruzam-se aqui, eu bem dizia que ele só pensava no Jesus e na morte. Como ser sincera, nós que temos tentado explicar a morte como ela é, o fim, mas ao mesmo tempo não dramatizar e sem me contradizer com o catolicismo possível - afinal, eu sempre assumo que existiu um Jesus que fez muitas coisas bem importantes, mas encaixar a vida eterna aí, já me põe uns pós na engrenagem, a mim, laica e republicana que sou e que aqui o nosso estado-casa é.

As perguntas são muitas, as respostas também, mas não estava preparada para tanta frontalidade e profundidade!

O meu cérebro anda assim, sou eu e o Nuno: